Muito prazer
Acordei e não éramos mais nós. Quer dizer, para mim, já não éramos. Porque muito mais importante que saber pra onde vai, é saber a hora certa de sair, sabe como? Não sair como quem vai ao mercado ou à feira. Sair com sapatos novos, pra mais um recomeço. Afinal, é disso que a vida é feita, não é? Os recomeços. Decidi que vou mudar o lado que divido o meu cabelo, o tom do blush e a cor do batom também já não me cabem mais. Decidi que vou pegar o caminho diferente, mudar o itinerário. Decidi, também, que agora eu uso um modelo de óculos – aquele aviador – que eu antes não gostava (ou fingia que achava brega) porque você desaprovava. É isso. Agora, eu pinto as unhas de vermelho – aquela cor que você não gostava. Decidi que nunca mais vou fazer ou deixar de fazer algo por conta da opinião de alguém. Especialmente se esse alguém tenta fazer com que o exercício de sua vontade sobre a minha seja algo doce, porque nunca é. No fundo, é sempre uma crueldade nada doce.
Você olha pra tudo isso a atribui ao meu processo de crescimento, sabe como? Com aquele seu ar de superioridade que lhe é peculiar… Como se eu fosse uma criança que estivesse buscando atenção ou provar algo para si e para o mundo.
Você despreza e diminui, como se fosse algo passageiro. Surpresa: não é.
Tudo bem, veja, esse texto não se trata de você. Se trata de mim. Até porque, seu comportamento, além de previsível, é compreensível. Deve ser difícil pra você olhar pra tanta liberdade e não conseguir me alcançar.
Eu entendo você não conseguir expressar seus sentimentos, meu (ex)amor. Você sempre foi obrigado a engolir eles. Igual engole suas vontades e tenta sufocar as minhas. Eu entendo tantas coisas sobre suas manias e traumas. Só que eu decidi que não quero mais ser espectadora do prelúdio da tragédia. Eu quero ser feliz no detalhe. Chega de entender você.
Fui invadida por tanta coragem, que decidi colocar o meu melhor sapato e ir embora. Sabe toda aquela coragem que você não tem? Ela nasceu em mim e veio forte. Tipo pra ficar, mesmo.
To muito mais interessada nesse papo que tenho levado comigo mesma.
Mais uma vez estou te encarando. Sentada na sala e pensando se ainda vou continuar pedindo a mesma bebida que você pedia por mim no restaurante. Recomeço, pode entrar, fique à vontade.
É o seguinte: não me sinto pronta. Estou ainda em construção. E tudo bem, né? A verdade é essa. Eu gosto do sabor dessa coragem que é bancar o que eu sinto e que me transborda.
Muito prazer.