Quem sair por último apaga a luz
Sempre gostei de ter gente por perto. De cultivar amizades longas. De namorar. De dormir acompanhada e acordar contando sobre os sonhos que tive, ou me indignando com as notícias do jornal da manhã. Sempre no plural, nunca singular. Quando eu era pequena, dormia com a minha mãe e acordava no meio da noite para ver se ela continuava lá. Não me orgulho dessa dependência toda, mas, foi o que me formou.
Me mudei recentemente para um apartamento novo e jurava que dormir sozinha seria a parte mais difícil – mal sabia eu de toda a roupa para lavar e casa para deixar em ordem –, quanto ao sono, nada que uma televisão ligada no volume baixo não ajude em qualquer eventual (e indesejada) sensação de solidão.
A mudança foi necessária. Não só por vencer meu grande e companheiro medo da solidão, mas, por perceber que tudo na vida se trata de ciclos. E que as pessoas morrem dentro de nós. Eu sei, é triste. Mas elas morrem. Todo mundo que passa por nós nos deixa um legado – assim como nós deixamos um pouco de nós por onde passamos.
Fechar ciclos é uma coisa difícil. Existe uma porção de gente que luta contra esse processo natural. Há quem postergue tanto, a ponto de viver anos lutando com algo que poderia ser resolvido em meses. O fim de um namoro, de um casamento, de uma amizade ou até mesmo de um emprego. A gente se acostuma com a situação e acha que ela faz parte da nossa vida. Esquecemos que nascemos sozinhos e daqui, possivelmente, só levaremos lembranças.
Gosto de dar o exemplo da Paola. Paola era minha amiga inseparável de infância e adolescência. Vivemos juntas, fomos aos shoppings da cidade, nadamos nas piscinas intermináveis do clube Santa Mônica e dividimos muitos salgadinhos. Ela me ouviu chorar toda a minha primeira paixão platônica e me deu a mão quando eu descobri que tinha asma. Paola era mestiça, assim, um pouco japonesa. Acontecia algo e eu já queria ligar para a ela e contar a novidade, pedindo sua opinião. Acontece que a gente cresceu. Eu comecei a namorar o Gabriel e a Paola, o Matheus. Eu decidi fazer Direito e Paola seguiu pela área da Medicina. Um dia, tivemos uma briga daquelas bem feias e quase que imperdoáveis. “Quase” é apenas modo de dizer, porque, foi mesmo imperdoável. Nós nos afastamos bruscamente, como a vida desejou. Hoje, uns bons anos depois, eu olho para trás e sinto uma gratidão enorme por todas as lembranças e momentos bons que vivemos. Tudo acrescentou para mim. Paola deixou ensinamentos e risadas. Ainda dou algumas quando lembro. Mas, passou. Paola morreu dentro de mim. Porque as pessoas morrem dentro da gente. E, nos cabe – com maturidade – aceitar o ciclo natural da vida. E quem sair por último apaga a luz. Afinal, quantas Paolas teremos em nossas andanças…